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O que este castelo Francês no Brasil tem a ver com a história e independência da indústria alimentícia Brasileira?

Fala pessoal,

Se vocês já comeram alguma maçã de origem brasileira, há grandes chances de que foram impactados indiretamente pela história que vou contar aqui. Talvez este artigo seja interessante para seus conhecimentos gerais sobre o Brasil e a sua indústria alimentícia.

A imagem de capa eu tirei em outubro de 2021 na minha cidade natal, Fraiburgo, localizada na região central de Santa Catarina. Hoje o castelinho é um Hotel super bacana, aqui está o site deles – https://casteloboutiquehotel.com.br/

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Centro da Cidade Década de 1970.

Essa construção de estilo normando (inspirada na Normandia, na França) fica no centro da cidade, no lado oposto ao famoso Hotel Renar, que foi construído em 1982 e aparece na foto abaixo.

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Hotel Renar – Fraiburgo

No pano de fundo dessa história — que mistura inovação, amor e resiliência — está o engenheiro agrônomo francês Roger Biau, convidado pelos fundadores da cidade, a Família Frey, para uma missão ousada:

Descobrir uma cultura agrícola que pudesse ser explorada em escala nas terras da região.

E para entender o desafio, vale destacar as características da área:

  • Solo argiloso e fértil anteriormente povoadas por milhares de araucárias centenárias.
  • Clima subtropical com invernos rigorosos (temperaturas abaixo de zero)
  • Altitude de 1100 metros acima do nível do mar

Foram mais de 12 anos de tentativas, erros e dezenas de viagens à Europa em busca de mudas que pudessem se adaptar.

Roger Biau: O Pai da Maçã Brasileira

Nascido em 1930 na Argélia, então colônia francesa, Roger Biau era especialista em frutas de clima temperado. Em 1963, chegou a Fraiburgo enfrentando todos os desafios possíveis: idioma, clima, infraestrutura limitada.

Mas ele persistiu. Liderou a implantação de pomares experimentais, introduziu mais de 500 variedades de frutas e 80 tipos de porta-enxertos. Após 12 anos de muito trabalho, a maçã se destacou como a aposta certa.

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Roger, 1967, preparação dos pomares

As primeiras árvores plantadas por ele ainda existem e são preservadas até hoje.

Esse movimento de investimento em pesquisa levou o Brasil de um importador de maçãs para um exportador. Tenho muito orgulho de ter vindo dessa terra, que prosperou não apenas pelo trabalho duro, mas também pela coragem de apostar em ciência e tecnologia — num tempo em que poucos acreditavam nisso. Arrisco dizer que até hoje poucos acreditam…

Fraiburgo: A Terra da Maçã

Graças ao trabalho de Roger Biau e da Família Frey (essa família merece vários outros posts) Fraiburgo se tornou referência nacional. Hoje, a cidade responde por cerca de 30% da produção de maçãs de Santa Catarina e 16% da produção nacional. Além disso, é destaque na produção de mel, com mais de 15 mil colmeias ajudando a polinizar os sete milhões de macieiras da região.

O “Castelinho” e a Revolução da Maçã

Agora, entra a parte mais curiosa dessa história.

Durante os primeiros anos no Brasil, a esposa de Roger, Evelyne, não se adaptou ao clima, à cultura e à vida longe da França. Com saudade de casa, ela queria voltar. Para convencê-la a ficar, Roger fez uma promessa: construiria para ela a casa dos seus sonhos.

Assim nasceu o “Castelinho”, inspirado nas casas da Normandia.

A construção, feita com pedras de basalto cortadas à mão, durou três anos e foi concluída em 1968. Mais do que uma casa, o Castelinho se tornou símbolo de amor, resiliência e do compromisso com a transformação da região.

Legado e Reconhecimento

O Castelinho consolidou a permanência dos Biau em Fraiburgo, permitindo que o projeto das maçãs chegasse ao sucesso.

Hoje, o Castelinho é um dos pontos turísticos mais emblemáticos da cidade. Em 2020, ele foi restaurado e transformado no Castelo Boutique Hotel, preservando a memória dessa história única.

Em 2024, Roger Biau foi homenageado no Livro do Mérito Catarinense, reconhecimento mais do que merecido pelo impacto que deixou não apenas em Fraiburgo, mas na história da agricultura brasileira.

Uma história de amor, ciência e independência

O Castelinho não é apenas uma bela construção francesa no Brasil: ele é um marco de uma história que mudou o rumo da indústria alimentícia nacional. Representa a virada de chave de um Brasil que dependia de importações para um país que passou a exportar inovação e qualidade no setor agrícola.

E é por isso que toda vez que vejo uma maçã brasileira, lembro que, por trás dela, existe uma história de amor, coragem e muita ciência.

Como historiador, pesquisador e empreendedor, deixo aqui esta homenagem ao trabalho de impacto que mudou a história de toda uma região. Que novos casos como esse continuem surgindo.

Joni Hoppen